Olavo (Braz Martins dos Guimarães)
Bilac nasceu no Rio de Janeiro em 16 de dezembro de 1865; faleceu na mesma
cidade, em 28 de dezembro de 1918. Cursou a Faculdade de Medicina até o 4º ano,
quando desistiu para fazer Direito. Sem vocação também para a carreira
jurídica, abandonou o curso alguns meses depois e passou a se dedicar ao
jornalismo e à literatura. Participou da vida política do País, patrocinando
campanhas cívicas como a do serviço militar obrigatório. Criou na Academia
Brasileira de Letras a Cadeira nº 15, que tem como patrono Gonçalves Dias.
Bilac é o mais popular representante da chamada
tríade parnasiana, da qual fazem parte ainda Raimundo Correia e Alberto de
Oliveira. Impregnado pelo humanismo clássico, foi adepto do “culto da forma”. Para
ele a Beleza era um ideal supremo, uma Deusa cujo “templo augusto” não podia
ser profanado.
Essa obsessão formal levou-o a
especular sobre os limites da palavra para traduzir as angústias e
perplexidades humanas. É famosa a passagem de “Inania verba” em que ele refere
a inconciliável antítese entre ideia e expressão: “O
Em sua lírica, o poeta exalta a dimensão
física e imanente do objeto amoroso. Opondo-se aos românticos, que revestem a mulher
de transcendência e impossibilidade, opta
por um sensualismo de fundo pagão. Nessa perspectiva humana e terrena desfaz-se
a noção de pecado, pois “mais eleva o coração do homem/ Ser de homem sempre e,
na maior pureza,/ Ficar na terra e humanamente amar”. A postura antirromântica
não impede que vez por outra ele cultive as suas “cismas” impregnadas de
nostalgia, das quais não está ausente o
sentimento de culpa.
TEXTO
Remorso
Às
Nestas
Cismo e padeço, neste
Calculo o
Ah !
Sinto o
Os
E
(Os
COMENTÁRIOS
Chama a atenção o tom confessional no “impassível” Bilac. O autor
deixa de lado a objetividade parnasiana para referir em tom sincero, pessoal, o
arrependimento pelo que deixou de aproveitar na vida. O poema antecipa o que,
algumas décadas depois, Manuel Bandeira expressaria nos versos “A vida inteira
que poderia ter sido e que não foi”.
Os dêiticos concorrem
para enfatizar a experiência pessoal. Uma coisa é falar genericamente do outono
da existência, confundido com o começo da velhice; outra é situar essa estação da
vida no momento em que se fala e, com isso, dar uma ideia mais concreta dos
seus efeitos.
Antítese entre duas metáforas (um tanto convencionais, por
sinal) que indicam momentos distintos e opostos da vida. Há metáfora, e não
metonímia, porque a analogia prevalece sobre a relação parte/todo, existente
quando alguém diz de outrem, por exemplo, que completou “quatro primaveras”
(por “quatro anos”).
O eu lírico lamenta não apenas os amores
que não teve, como também os versos que não produziu. A oposição entre “calar” e
“cantar”, presente no primeiro e no quarto versos, sugere a identificação entre
vida e poesia. Demonstra que o arrependimento é tanto do homem, pelo que deixou
de viver; quanto do artista, pelo que deixou de criar.
O teor declarativo desse verso mostra que o emissor não hesita entre
duas possibilidades. Reconhece que se sacrificou, ora por conveniência social,
ora por autêntica virtude. A eventualidade de ter sido pelo segundo motivo não
torna menor o seu remorso, pois os dois tipos de renúncia conduziram a idêntica
privação da arte e do amor.
A estruturação em frases nominais da última estrofe destaca os
substantivos (beijos, versos) e termos equivalentes (os pronomes “o” e “que”, relacionados
à ideia de sofrimento). Dispostos como núcleos dos versos, esses termos reiteram
o que foi perdido mas perdura na lembrança do eu poético.
O reconhecimento dos motivos que levaram à perda constitui um
exercício de análise típico de quem avalia a própria vida. Nem sempre esse
reconhecimento abranda os efeitos do remorso. Pelo contrário, até os agrava, conforme o
poeta sugere ao equiparar a “tolice” o excesso de pudor e timidez.